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Alterações ao NRAU

As novas alterações à Lei do Arrendamento Urbano levantam uma questão pertinente, quanto à sua aplicação no tempo versus segurança jurídica.

 

Regra geral, a lei restritiva de direitos, liberdades e garantias não pode ter aplicação retroativa, exceto se for em matéria penal ou fiscal e desde que mais favorável ao arguido. A aplicação de uma lei a atos ou situações já constituídas anteriormente é uma aplicação por retroatividade autêntica, e esta não é permitida pela nossa Constituição.

 

No caso concreto, a Lei 43/2017, de 14 de junho, perante a ampliação do período de transição, no caso de contratos celebrados antes da entrada em vigor do RAU, vg. Rendas antigas, para oito anos vem limitar, ainda mais, o direito à propriedade privada previsto no art.º 62º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa.

 

Os senhorios que há muito se vêem a braços com a espiral “não faço obras por cobrar rendas que mal chegam para pagar impostos versus não consigo aumentar as rendas para poder fazer obras”, vêem-se agora adstritos a mais 3 anos de sacrifício para além do previsto inicialmente.

 

Bem sabemos que a função social do Estado o compromete a garantir o direito à habitação, mas não pode o Estado imiscuir-se nas relações privadas, pondo e dispondo, dos bens de privados ao serviço da função social do Estado.

 

Numa altura em que Portugal está tanto na moda, há muitos investidores de médio-longo prazo, portugueses e estrangeiros, que optaram por comprar casas arrendadas, mesmo sabendo da limitação da transição dos contratos antigos para o NRAU.

 

Ainda assim, sabiam de antemão que ao fim do prazo dos 5 anos tinham forma de conseguir rentabilizar os seus investimentos e começar a recuperar valores investidos, bem como a melhorar as condições de habitabilidade das frações e, quiçá, das condições estruturais dos edifícios, levando assim, sucessivamente, a mais rentabilidade.

 

Qual será, então, a reação a esta alteração ao NRAU por alguém que vê agora frustrado o seu investimento e se vê obrigado a prolongar o seu investimento, sem retorno, por força de cumprimento de regras impostas pelo Estado para satisfação da sua função social?

 

No mínimo, deveriam estes investidores processar o próprio Estado por gerar insegurança jurídica no mercado do arrendamento, vendo os seus investimentos frustrados, com perspetivas de prejuízos que se podem revelar graves.

 

Parece que o Estado Português dá com uma mão, mas tira com outra.

 

Será justo, legal e constitucional, expropriar ainda que temporariamente, o livre direito de dispor dos seus bens em detrimento de satisfação de necessidades sociais? Não. A expropriação, ainda que do direito de dispor dos seus bens, tem de ser indemnizada pela privação.

 

Muitos senhorios e investidores não irão aguentar este tamanho sacrifício, esta tamanha injustiça. Provavelmente, o Estado verá o efeito boomerang desta medida: fuga de investidores, prédios cada vez mais degradados, fuga a impostos e outras tantas situações.

 

Deve um investidor conformar-se com a privação do poder de dispor dos seus imóveis para além daquilo que sabia estar privado? A resposta é não. O Estado fere, da forma mais grave e flagrante, o direito a poder dispor da propriedade privada – vender e arrendar - para que, através do sacrifício de privados consiga atingir os seus objetivos de proteção social, violando o principio da segurança jurídica, o principio da igualdade e da proporcionalidade.

 

Não é constitucional, legal nem justo que a meio do jogo sejam as regras alteradas, por imposição do Estado. Não é justo que continuem os privados a pagar, caro, pelo mau funcionamento da máquina do Estado.

 

Quer parecer que esta foi a forma que o Estado encontrou de adiar o pagamento de subsídios de renda previstos para o final dos 5 anos de transição, agora 8.

 

A mais recente alteração deveria ter aplicação, apenas, para aplicações do regime de transição a partir da sua publicação, e não a situações anteriores.

 

Mas provará o Estado do seu próprio veneno quando os arrendatários pedirem a sua intervenção por habitarem imóveis sem condições de habitabilidade. E porquê? Porque o Estado está obrigado a garantir o mínimo de condições de habitabilidade.

 

Decorridos os 8 anos, voltaremos a falar e veremos que alterações serão feitas para continuar o Estado a “delegar” em privados o exercício da sua função social.

Alexandra de Mendonça Bretes * Jul 2017

© 2017 * Alexandra de Mendonça Bretes

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